NOSSA “BATALHA DE ARGEL”

 

 

    Da Constituição de 1824:

     Artigo 148 — Ao Poder Executivo compete privativamente empregar a Força Armada de Mar e Terra, como bem lhe parecer conveniente à segurança, e defesa do Império.  

 

     Da Constituição de 1988:

     Artigo 136 — O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar e prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidos por calamidades de grandes proporções nba natureza.

     Artigo 137 — O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretar o estado de sítio nos casos de:

                  I — comoção intestina grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia da medida tomada durante o estado de defesa (…)

     Artigo 142 — AS Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica (…) destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.  

 

     De “La vraie bataille d’Alger” do General Massu:  

      a certa altura de 1955, ele, Comandante da Décima Divisão de Pára-quedistas, foi chamado pela autoridade civil competente e recebeu ordem para, com seus homens, restabelecer a ordem na capital da Argélia, acossada pelo terrorismo da FLN. Massu e seus Coronéis tinham, afora o treinamento de pára-quedista, a experiência da batalha da Indochina.

 

    Creio desnecessário ressaltar o quanto que o Estado brasileiro estava mais bem defendido pela Constituição do Império. Se registro dispositivos constitucionais que zelavam e ainda são supostos zelar pela ordem interna, é apenas para que se possa discutir a grave situação que foi criada não só na Capital como em todo o Estado de São Paulo desde o mês de maio. Ao comentá-los, naquela ocasião, procurei chamar atenção para as circunstâncias que poderiam acompanhar o emprego do Exército caso fosse chamado para resolver a situação. Creio necessário, hoje, voltar ao assunto, na esperança de ser lido e de que minhas ponderações sejam consideradas no momento em que for decidido empregar força federal para combater o PCC.  

 

     Vamos, primeiramente, à situação internacional, como convém a uma análise de situação.  

    O Governo do Estado de São Paulo já foi objeto de uma decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, com sede em São José da Costa Rica, após examinar (e condenar) a situação da FEBEM. Será ele, com toda certeza, solicitado por alguns dos defensores dos direitos humanos (ou até pela ONG que ex-policiais organizaram para defender os direitos dos presos) a examinar a situação em que se encontram os presos nos presídios que eles próprios, os presos, destruíram em revolta contra o Governo. A ação de Brasília, qualquer que seja, apenas transferirá o julgamento para o plano federal, podendo fazer que o caso seja levado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU… O que deverá levar o Presidente Lula e seus assessores a ponderar o auxílio que oferecem ao Estado de São Paulo. Apenas uma observação: pela Carta de 1824, o Poder Executivo Central não ouvia os Presidentes de Província para decidir quando o Império estava em risco.

 

      No plano nacional e estadual, comecemos pela crítica.  

     A iniciativa estratégica pertence ao PCC. Será inútil fazer bonitos discursos sobre a normalidade da situação que “está sob controle” (o que fez o Presidente da República ironizar o Governador de São Paulo), quando diariamente se faz saber à população que algo de mais grave a espera. O exame da situação deve começar, como diria Clausewitz, pela “crítica” — e se cito o cavalheiro é porque estamos em guerra, queiramos ou não.

 

     O inimigo escolheu o terreno em que daria combate ao Governo, podendo chegar ao Estado Nacional. O Governador Cláudio Lembo, aliás, ao lado do Ministro Thomaz Bastos, disse claramente na sexta-feira, 14, que a luta era contra o Estado Nacional. Se o Ministro da Justiça entendeu o recado ou não, é outra história. Qual foi o terreno escolhido? Os presídios. O inimigo o ocupou no momento em que destruiu o de Araraquara e, noticiado apenas uma vez, parte do de Presidente Wenceslau, de segurança máxima.  

 

     A fotografia dos 1.200 presos amontoados num pátio do presídio de Araraquara deve ter corrido mundo. E chocado os que pensam que o Estado, tendo sob sua guarda os que condena à prisão, não pode mantê-los em situação tão dolorosa. Convenha-se que o inimigo entende de Direitos e Política mais do que o Governo de São Paulo e o Federal: que fazer para resolver uma situação que deixa o Governo do Estado de São Paulo vulnerável a qualquer ação perante a Corte de São José da Costa Rica?  

 

     Para colocar o presídio em condições de abrigar “humanamente” (isto é, no rigor estrito da lei) os presos, será necessário retira-los do pátio e transferi-los para outro local. Qual? O inimigo sabe que não há para onde, pois conhece, por experimentar todos os dias na carne qual é a situação carcerária do Estado. Para resolver a situação de Araraquara seria talvez preciso entregar o problema a quem cultua a teoria dos jogos e encomendar um grande computador (de preferência do Pentágono) para permitir que se chegue rapidamente a uma solução em que o Governo, isto é, a Autoridade, não perca e os presos não fujam.  

 

     Ainda no que concerne à iniciativa estratégica, o inimigo a tem, mais ainda, porque o Governo não sabe onde vai atacar. O Estado de São Paulo é imenso, todos sabemos. Se os primeiros ataques foram feitos na Capital, isso foi feito para que se tomasse consciência do que estava por vir. Hoje, todo o território do Estado está à mercê dele, inimigo. Para tranqüilizar a população, o Governo anunciou na sexta-feira, 14, a prisão de mais de 60 suspeitos, muitos dos quais eram de fato os criminosos. Aonde vai retê-los até que se conclua o devido processo legal? Para que se observe a lei, é preciso que os delegados indiciem os presos, o Ministério Público os acuse (se não antes cuidar de verificar se não foram maltratados), e que o Judiciário os condene. Antes do julgamento, o MP pode solicitar a prisão preventiva de todos — dentro da lei, que prevê prazos para que o acusado se mantenha preso antes de ser julgado. Não houve quem, preso preventivamente por duplo homicídio com requintes de crueldade, foi solto por decisão judicial porque o prazo da preventiva se tinha esgotado sem que o julgamento tivesse sido realizado e a pena imposta?  

 

     O inimigo tem muitos advogados. Convenhamos que os que apareceram até agora sabiam que corriam riscos enormes ao transmitir informações para os que estavam aqui fora. Eram e são os bagrinhos da corporação jurídica do inimigo. Não haverá cérebros mais cuidadosos e bem formados que estejam instruindo os passos jurídicos, dentro da lei que o Estado é obrigado a observar, que o inimigo deva dar?  

 

     Há outro fator que milita em favor do inimigo no quadro da iniciativa estratégica. Ou dois, para sermos exatos. Um deles é que ninguém sabe quem será a próxima vítima, nem quais serão os próximos alvos. O inimigo pode até brincar na escolha deles, porque qualquer um serve a seu propósito. O outro fator é que ele aprendeu com as guerras do Iraque e a ampla literatura que se produziu sobre os milagres militares da tecnologia, o que seja CCCI (não confundir com PCC): Comando, Controle, Comunicação e Informação. Falando sem restrições mentais, o índice de CCCI do inimigo é maior que o das forças de segurança do Governo e do Estado. Por quê?  

 

     Porque:

          1. O Governo ainda não conseguiu controlar as comunicações dos presídios para fora, ainda que intercepte o que é dito. Intercepta, mas não conhece os códigos em que o inimigo se comunica. Pode, quando muito, supor e agir em conseqüência — sem saber onde e quando se dará o golpe.

 

          2. O inimigo conhece os códigos de comunicação do Governo. A televisão não mostrou uma folha de caderno em que o criminoso anotava todos os canais em que a Polícia Civil e a Polícia Militar trocavam informações? Isso significa que o inimigo tem informantes onde os convém ter. E o Governo ainda não sabe quem são, nem quantos são, nem onde estão.

 

          3. O inimigo tem um comando unificado, coisa que as forças da lei e da ordem ainda não têm. Ademais, o inimigo tem o controle das ações adversárias. Sem dúvida, houve as prisões e os “exércitos” dos inimigos da lei e da ordem estão desfalcados. Até quando? Quantos delinqüentes estão soltos? Quantos não criminosos estão dispostos a auxiliar o inimigo para vingar-se de sua situação social e humana? Ninguém sabe. O inimigo conta com isso, também.

 

      Na medida em que o Governo e o Estado devem respeitar as leis que fazem, o inimigo tem a vantagem político-estratégica, pois a lei que este faz, ou seja, a lei que é sua lei é obedecida sem discussão em quaisquer tribunais ou movimentos de defesa de não se sabe quais direitos.  

 

     Em médio prazo, o inimigo tem um ponto fraco, mesmo que domine o campo CCCI: suprimentos. Por suprimentos entendo o nervo da guerra: dinheiro. As fontes de abastecimento do inimigo estão reduzidas: os assaltos a banco tornaram-se empresa perigosa demais e os seqüestros, tendo sido banalizados por criminosos menores e não organizados (o inimigo pode valer-se dos seqüestros relâmpagos, sem dúvida), também deixaram de ser instrumento arrecadador eficiente. Sobra apenas o tráfico de drogas. Esse fato complica a situação, pois remete a uma eventual aliança com as FARC — que têm no Brasil um bom mercado e uma rota mais ou menos segura para mercados igualmente rentáveis.  

 

     É sobre esses dados que enumerei que se deve meditar. E também sobre um outro, mais grave: há notícias de que o inimigo está organizado no Paraná e que pretendia, depois de roubar quilos e quilos de dinamite e detonadores, destruir a penitenciária federal em Catanduvas por ocasião de sua inauguração, com todas as autoridades cabíveis presentes, inclusive o Ministro da Justiça. Além de pretender explodir outras prisões no Estado. O ataque foi frustrado, mas os explosivos não foram achados. Felizmente, um outro plano foi frustrado, pois em Mato Grosso do Sul, os presos pretendiam seqüestrar o Juiz de Direito, o Comandante da PM e o Diretor de um presídio.  

 

     Outro qualquer tipo de abordagem será pura perda de tempo.  

 

     O Governo e o Estado, que têm?  

     Durante anos, de 1964 em diante, falou-se em guerra subversiva. Durante um bom tempo, disse-se que o Comando Vermelho tinha aprendido com os subversivos companheiros de cela a como se organizar e agir contra a vida, a propriedade e a lei. Agora, noticia-se que o comandante do inimigo é versado em Lênin e, mais do que isso, em Sun Tzu e sua arte da guerra. Antes de maio, muito antes, informou-se que Fernandinho Beira Mar tinha sido preso na Colômbia, junto com homens das FARC. Em maio, alguém falou (evidentemente com intuito de alarmar) que talvez as FARC estivessem detrás de tudo o que acontecera. Muitos falaram, mas pouco disseram. Falaram muito e não disseram porque foram incapazes de tirar as conclusões óbvias do que haviam falado. Ora, se as FARC estão por trás ou em conluio com o inimigo, a guerra muda de objetivos e de proporções. Tentemos retirar algumas das lições do passado.

 

         1. Estamos diante de uma guerra subversiva. Subversiva, sim, porque as instituições estão sendo subvertidas na medidas em que a população começa a não ter mais confiança no Governo e, por conseguinte, no Estado. O inimigo ainda não disse que quer subverter a ordem pública e tomar o poder. Ainda! Lembraria a quem me lê que há meses, alguns, divulgou-se um documento do PCC cuja linguagem era nitidamente política e, mais, social! E que, nos documentos apreendidos certa vez, havia clara referência a uma bomba na Bolsa de Valores e ao seqüestro do seu Presidente.  

 

         2. Por não interpretar devidamente esses dados, os dois Governos — o estadual e o Federal — tratam a crise como se fosse uma luta entre o Estado e criminosos comuns que estão com raiva porque são maltratados na prisão. Até agora são criminosos comuns. Comuns porque seu comandante que lê livros sobre a arte da guerra assim decidiu que são. E se o dado, alarmante sem dúvida, a respeito da participação das FARC, for verdadeiro? Por não ver as coisas desse prisma, os Governos Federal e estadual cometem um erro. Erro crasso que levará a situações ainda mais difíceis para a população.

 

         3. Em boa parte, o Governo Federal e o do Estado de São Paulo se negam a ver a crise como uma etapa da guerra subversiva porque nunca tiveram de enfrentar esse tipo de ação. Reflitamos sobre a subversão dos anos 1964 em diante: os crimes contra oficiais e soldados das Forças Armadas foram poucos, porque as pessoas não eram seus alvos, exceto as que se empenhavam na repressão (o brutal assassinato do Tenente PM por Lamarca ocorreu numa situação de guerrilha, quando ele fugia de um cerco do Exército). O atentado contra o II Exército foi uma exceção no tipo de ação. Os subversivos daquela época concentraram-se em assaltos a bancos, para arrecadar fundos, mas não cuidaram de assustar a população cometendo atentados a bomba contra indústrias ou outras propriedades como as guerrilhas faziam em outros países da América Latina. As ações guerrilheiras, convenhamos, por mais baixas que tenham causado, ao se inspirar na doutrina do “foco” de Guevara, não tinham, como não tiveram, futuro. A população estava com o Governo e condenava os subversivos que eram mais subversivos (em alguns casos, assassinos que buscavam alvos privilegiados) do que terroristas. Hoje, estamos diante de ações terroristas comandadas, coordenadas, abusando da tecnologia moderna e da necessidade em que se encontram o Estado brasileiro e o Governo paulista (necessidade auto-imposta, porque a consideram mais importante que o problema que devem enfrentar) de não sair ostensivamente dos limites da lei…

 

         4. As forças encarregadas de defender a população, a lei e a ordem — nesta ordem, sim, senhores! — têm um baixo índice de CCCI, porque estão presas ao mito federalista e ao horizonte eleitoral. Alguém imagina o Presidente Luis Inácio Lula da Silva capaz de ouvir sigilosamente os dois Conselhos constitucionais, passar por cima do Governador Cláudio Lembo e decretar o Estado de Emergência em todo o Estado de São Paulo e, dez dias depois, pedir que o Congresso se reúna para decretar o Estado de Sitio no Estado de São Paulo, mandando o Governador Lembo e sua (dele, Lula) reeleição para o espaço? Eu não imagino! Já sobre o mero deslocamento de força do Exército para patrulhar as ruas, remeto ao que escrevi em maio sobre o confronto de São Paulo entre o PCC e a PM.

 

         5. As lições de organização a duras custas aprendidas depois de 1967, quando se deu a unificação das forças de repressão e se estabeleceu a chamada “Comunidade”, foram esquecidas. Da mesma maneira, equivocada, continuou-se acreditando que a “Comunidade” eram o SNI e os DOPS estaduais, quando não era nada disso, mas apenas um grupo especializado em analisar informações obtidas pelas forças de repressão e, a partir delas, programar ações coordenadas. Como os arquivos dos DOPS foram abertos à pesquisa universitária e o Departamento de Ordem Política e Social paulista foi extinto juntamente com o SNI – em nome da democracia -, pouca informação existe que possa subsidiar os que estão empenhados no combate a essa nova guerra subversiva desconhecida até agora de todos nós. Perdeu-se a memória do Estado no campo da repressão aos crimes contra a segurança nacional, apesar dos detidos estarem sendo processados por crimes contra a segurança nacional… O que é grave é que os Governos Federal e estadual têm agora, além da missão de defender (?) a população, a de resguardar, escondendo, seus próprios quadros que por ventura tenham agido de maneira a desbaratar aparelhos do inimigo.

 

      Por tudo isso, sem ter a iniciativa político-estratégica ou estratégico-militar, ambos os Governos estão numa defensiva cheia de perigos e sem reserva estratégica, como se diz nas guerras entre Estados.  

      Resta refletir sobre os motivos que me levaram a fazer, de início, uma referência à batalha de Argel.

  

      O que se segue é um resumo sumário daquela batalha que decidiu a sorte da Quarta República francesa.  

 

     Quando o General Massu foi chamado para assumir o controle da cidade e da região de Argel, ambas viviam num regime de temor em conseqüência do clima de terror implantado pela Frente de Libertação Nacional. O General não conhecia o terreno e da guerra subversiva apenas sabia, da mesma maneira que seus Coronéis, o que aprendera da guerra do Vietminh contra a França na Indochina. Sua formação era militar — e a doutrina que inspirava suas ações, igualmente. Apesar das resistências corporativas, assumiu o controle da Polícia Civil e da Gendarmaria, ainda que ficasse subordinado a um Comando militar mais alto e ao Governador-geral, civil nomeado pelo Governo de Paris.  

 

     A missão da 10ª Divisão de Pára-quedistas era garantir a população francesa ou européia em geral, a população árabe (em maioria) e vencer a FLN. O tipo de terrorismo que os rebeldes praticavam chegava com freqüência à barbárie, indiferentemente fosse contra europeus ou árabes suspeitos de colaborar com os franceses ou de não cumprirem as ordens da FLN.  

 

     A primeira providência de Massu, a quanto recordo, foi ocupar o terreno: ler o mapa da cidade de Argel, localizar os pontos estratégicos (da perspectiva tanto dele, quanto da FLN), isto é, cruzamentos, onde terminava uma rua e começava outra e assim por diante. A tropa foi para a rua não para, como se viu no Rio de Janeiro, recentemente, ficar nas calçadas, fuzil na mão, um soldado a cem ou mais metros do outro. Massu precisava dizer à FLN, e aos árabes que tinham medo de colaborar com o Governo, que o terreno era dele, isto é, francês. Nos pontos que considerava estratégicos, as patrulhas de pára-quedistas, todos fardados, com a boina distintiva, exerciam a função de ocupantes de território. Os suspeitos que detinham eram encaminhados para campos de prisioneiros em que se processava o primeiro interrogatório. Note-se: campos, não prisões, porque o Exército não controlava prisões, nem as havia com espaço suficiente para todos os que eram detidos.  

 

     As informações com que Massu trabalhava provinham da memória da Polícia Civil (os arquivos dela), dos árabes ou berberes que se dispunham a colaborar e as que se obtinham nos interrogatórios nos campos de detenção. Quando o suspeito se recusava a falar e havia indícios de que era membro da um aparelho ou de um grupo de terroristas (três no máximo para cada grupo) era levado para locais especiais em que métodos especiais eram aplicados. Se me refiro a esses métodos é porque Massu, em suas memórias, as eles se refere sem restrições mentais.  

 

     Em Argel, os árabes se concentravam na Casbah, sua cidade, tortuosa como nossas favelas, onde reinava, quando Massu chegou a Argel, a lei do silêncio. Ele ocupou o terreno, quarteirão por quarteirão, recenseando os moradores e prendendo os que eram suspeitos ou tinham uma anotação no QG da Divisão ou nos arquivos da Polícia Civil. Aos poucos, a boina pára-quedista passou a ser respeitada (não mais temida) na Casbah.  

 

     Quando se deu a ocupação da Casbah, os soldados invadiram as casas com um mandado de busca e apreensão contra alguém ou algumas pessoas desconhecidas. Era necessário respeitar a lei. Em muitos interrogatórios, o “parquet”, o MP francês, estava presente e muitas vezes denunciou Massu e seus métodos.  

 

     Massu e a 10a. Divisão de Pára-quedistas — que sofreu muitas baixas — venceram a batalha de Argel do ponto de vista militar. As hesitações do Governo de Paris, que não aprendera as lições da Indochina, e a falta de inteligência política dos europeus que viviam na Argélia permitiram que a FLN triunfasse politicamente, levando, em 1962, à paz de Evian e à retirada de um milhão de europeus do antigo Departamento francês — pois, constitucionalmente, a Argélia era um Departamento, território de ultramar e não colônia… Note-se, porém, que de 1954 a 1962, a França pouca importância deu à reação internacional, sempre vetando resoluções aprovadas por maioria no Conselho de Segurança e não atendendo a pressões de Washington.

 

     Hoje, em São Paulo Capital e em todo o Estado, vivemos nossa versão da batalha de Argel. Talvez nos falte um Massu para vencê-la militarmente. Politicamente, é outra história, a que os “Leopardos” da 10a. Divisão tentaram escrever no 13 de maio de 1958, quando se sublevaram contra a Quarta República. Mas perderam essa batalha, levando o General de Gaulle ao poder.

 

  

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