UMA VISÃO HETERODOXA DO PROCESSO – 18

 

 

 

 

     O “comitê de propaganda” de Geisel cuidou de apresentá-lo, antes da eleição, como o General que, por seu passado, iria conduzir o processo político para a abertura. Consolidada a sua candidatura, a censura ao noticiário sobre a sucessão de Médici foi suspensa. A candidatura Geisel foi referendada pelo Congresso por 400 votos contra 76 dados ao candidato do MDB, Ulysses Guimarães.

 

     Embora, durante os cinco anos em que esteve no poder, Geisel sempre prometesse uma abertura gradual e progressiva, o combate à subversão foi tão duro quanto no Governo Médici. A abertura realizou-se gradualmente como prometido. Vencida, no Governo anterior, a crise interna – quando foram derrotados os que pretendiam que o Partido se dissolvesse –, o MDB conquistou a maioria no Senado em 1974 e, em 1976, em praticamente em todas as Capitais. No que podemos entender por “Interior”, a Arena foi vencedora em 1976.

 

     Em 1977, para espanto de boa parte do meio político, Geisel editou reforma da Constituição − o chamado “Pacote de abril”. Criou-se, então, a figura das Medidas de Emergência, abrandando aquelas constantes do Estado de Sítio e, fato não observado por muitos, um artigo estabelecia que os Atos Institucionais deixariam de vigorar a partir de Janeiro de 1979, embora seus efeitos jurídicos persistissem. Com o “Pacote de Abril”, a abertura ganhou forma jurídica e concretizou-se a 1º de janeiro de 1979, quando o País voltou a ser regido pela Constituição de 1967 e os Presidentes da República não mais puderam editar Aos Institucionais em nome da Revolução. É importante assinalar isso quando temos como referência os fatos, não as ideologias e as eventuais necessidades políticas, pois a Academia e praticamente todos os meios de comunicação insistem em que a “democracia” foi recuperada apenas em 1985 com a eleição de Tancredo Neves e José Sarney.

 

     A essa versão, o ex-Presidente Collor opõe a sua: a democracia teria retornado apenas com sua eleição direta para a Presidência… Collor terá razão se concordarmos todos com que a Democracia só existe quando o Presidente da República é eleito por voto direto. Afirmação que é sobremaneira ideológica, pois, na realidade, são muitas as democracias em que o Presidente da República é eleito por voto indireto, pelo Congresso ou por um Colégio Eleitoral. O exemplo mais evidente são os Estados Unidos. Outro é França, que durante toda a III República e, depois, na IV (1946/1958) teve o Presidente da República eleito pela Assembléia Nacional. O argumento da Academia e da Mídia estriba-se em que o Governo Figueiredo não foi democrático porque ele, Figueiredo, era um militar − esquecendo-se, acadêmicos e jornalistas, de que Dutra (1946/1950) era militar e que foram democráticas as eleições de 1945, quando o candidato de oposição a Dutra e Vargas foi também um militar, o Brigadeiro Eduardo Gomes, esquecendo-se ainda de Eisenhower, de Gaulle e outros mais em países ditos essencialmente democráticos e também dos civis que, após serem eleitos, formaram ditaduras em que eleições foram abolidas.

 

     A insistência em que Democracia é igual a eleição direta do Presidente da República permite que se revejam as raízes da crise brasileira − são muitas, não nos façamos ilusões. Uma delas é que, mesmo na República de 1946 − Getúlio em 1950, Juscelino em 1955 e Jânio em 1960 (com todas as restrições que se lhe façam, sua eleição foi saudada como uma “revolução pelo voto”) e em todas as eleições que se realizaram sob a égide da Constituição de 1988, o que se evidenciou, quando se abriram as urnas, é que o País e suas instituições estavam divididos − e nisso, Brizola tinha razão: o Presidente eleito pelo voto direto representaria o sentimento da maioria da população de que se faziam necessárias mudanças na distribuição da riqueza, enquanto a maioria eleita para o Congresso representaria aqueles que desejam a manutenção das coisas como são ou simplesmente concordam com pequenas mudanças que não alterem as relações de poder na sociedade. Tivemos, então, Presidentes “progressistas” e Congresso “reacionário”, “reformista” ou “conciliador”.

 

     Há quem aponte erros nessa interpretação, dizendo que Collor e Fernando Henrique não podem ser tidos como “progressistas”. Note-se, porém, que a candidatura Collor permitiu o estranho casamento dos interesses daquela parte do empresariado que queria a abertura da economia com a boa parte do eleitorado que via no candidato a juventude capaz de transformar, ainda que em parte, pelo ímpeto que lhe seria próprio, as relações de poder na sociedade. Fernando Henrique, esse, atendeu ao empresariado nacional e estrangeiro que desejava a privatização (criando as condições para que o Estado, via Institutos de Previdência, como a Previ, mantivesse sua presença na economia) e aos que saudavam a estabilização da moeda, fruto do Plano Real em seu início. As eleições que levaram Lula e Dilma ao poder mais confirmam o que se disse acima.

 

     Do ponto de vista econômico, Geisel teve de enfrentar as seqüelas do primeiro choque do petróleo, que permitiu que a liquidez internacional aumentasse de maneira extraordinária, os petrodólares inundando o mercado financeiro sem que os investidores e os tomadores de empréstimos nessa moeda deixassem de lado maiores considerações de risco: uns, para ganhar, outros para atender a suas necessidades, reais ou supostas, de realizar empreendimentos que permitissem o desenvolvimento econômico de seus países. O Governo Geisel foi um dos que entrou nesse jogo sinistro em que os empréstimos para obras de longa maturação do capital investido eram de curto prazo, exigindo sua renovação a juros quase sempre maiores. Difundiu-se, assim, sem que se atentasse para o fato de que os empréstimos deveriam ser renovados de tantos em tantos meses, a idéia de que o Governo contratara empréstimos de longo prazo com juros variáveis…

 

     Apesar de Geisel insistir na tecla de que o Brasil era “uma ilha de tranqüilidade”, o balanço de pagamentos e as reservas cambiais não conseguiam atender aos compromissos assumidos no Exterior. Aventou-se, a certa altura, a necessidade de a gasolina e outros derivados de petróleo serem racionados. A discussão durou poucos meses e nada se fez: afinal, éramos uma “ilha de tranquilidade”. Como não se diminuiu a importação de petróleo e derivados, a solução encontrada para impedir uma crise no balanço de pagamentos foi simples: fizeram-se projetos em nome de empresas estatais que levantavam, cada uma por sua vez, novos empréstimos, com os quais era possível atender aos compromissos vencidos. Essa contradança colocou, depois, o Governo Figueiredo em má situação, que se agravou no Governo Sarney, obrigado que foi esse a decretar a moratória.

 

     Na política externa, o Governo Geisel aprofundou os contatos com a África, reconheceu o MPLA como Governo de Angola (embora esse grupo não dominasse todo o território angolano), reconheceu o Governo da República Popular da China (Mao Tsé-tung), denunciou o acordo militar com os Estados Unidos e teve dificuldades com o Governo norte-americano em virtude do acordo nuclear com a Alemanha e a questão dos direitos humanos. E também com a Argentina, que se opôs, o quanto pôde, a que Itaipu fosse construída de acordo com o projeto inicial que estava sendo executado. Para surpresa de muitos, votou resolução na ONU condenando o sionismo como racismo.

 

     O atrito com os Estados Unidos, que se empenhavam para que, no combate à subversão armada, fossem respeitados os direitos humanos, vinha desde o Governo Costa e Silva, depois da edição do Ato institucional nº 5. A situação agravou-se no Governo Carter, levando a um esfriamento das relações entre os dois países.

 

     O acordo nuclear teve conseqüências mais sérias, que persistem até hoje. A justificativa oficial para o acordo com a Alemanha − em livro branco editado à época − foi que o potencial hídrico do País estava esgotado. Ao mesmo tempo em que divulgava o livro branco, o Governo cuidou de explicar a platéias seletas as razões que haviam levado à assinatura do acordo. O objetivo final era o domínio do ciclo completo do átomo. A estratégia para chegar-se a isso obedeceu a algumas ações diríamos táticas. A primeira foi a compra de Angra I para que os técnicos brasileiros pudessem familiarizar-se com a operação de uma usina atômica. A segunda etapa foi procurar, no mundo, um país que se dispusesse não só a vender uma usina, mas também a transferir a tecnologia de enriquecimento do urânio e prover a base industrial para esse enriquecimento e a fabricação de tudo o que fosse necessário para que se chegasse ao domínio completo do ciclo do átomo. Os Estados Unidos foram descartados de início, tendo-se em vista que a legislação norte-americana proibia a transferência dessa tecnologia. Procurou-se a França − mas o projeto que ela podia oferecer não atendia às necessidades brasileiras. Finalmente, chegou-se à Alemanha Federal. O Governo de Bonn (a reunificação ainda estava longe) concordou com fazer a transação, oferecendo um processo de enriquecimento que tinha sido provado em laboratório. Celebrou-se, então o acordo, que previa a construção de dez usinas átomo-elétricas, além do fornecimento de toda a indústria necessária para que o Brasil pudesse chegar ao objetivo colimado.

 

     Apesar de o acordo ter sido aprovado pelo Congresso com os votos da oposição, o Governo Geisel encontrou sérias objeções de parte da Imprensa e da comunidade científica, todos temendo que ele abrisse o caminho para que o País construísse a bomba atômica. Idêntica reação observou-se no Exterior, levantando-se as mais estranhas explicações para o fato de a República Federal da Alemanha ter assinado o acordo. Na mais conspiratória delas, em poucas palavras, Bonn havia encontrado no Brasil um Governo que se dispusesse a fazer, para a Alemanha Federal, a bomba atômica. Sucede que, em 1955, a República Federal se comprometera, em tratado, a não fabricar armas atômicas, químicas e bacteriológicas, além de haver, depois, assinado o TNP que vedava a venda de quaisquer materiais atômicos para fins militares. Houve quem dissesse que o acordo não tinha a menor possibilidade de tornar-se realidade na medida em que o Brasil, enquanto não chegasse ao estágio de enriquecimento, deveria comprar da Euratom ou dos Estados Unidos o urânio necessário para fazer funcionar as usinas atômicas.

 

     Desconhecem-se as razões que levaram Governo brasileiro a chegar à conclusão de que havia feito um mau negócio − em linguagem popular, comprara um bonde. Se a real intenção foi abrir caminho para a construção da bomba (lembremo-nos de que o Tratado de Tlatelolco permitia a construção de engenhos atômicos para fins pacíficos e de que o País não assinara o TNP), descobriu-se, depois do acordo nuclear assinado, que, ao assinar o TNP, a Alemanha não poderia vender um parafuso sem que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) fosse notificada. Em outras palavras, se o fim último de tanto empenho fosse de fato a bomba, o caminho estava fechado.

 

     Aceitando-se, no entanto, pelo seu valor de face, que o desejo do Governo era ter o domínio completo do átomo e nada mais, entende-se a solução dada por Geisel ao problema: cada uma das Forças Armadas cuidaria de trabalhar, separadamente, para encontrar o melhor caminho para enriquecer o urânio: a Marinha trabalharia com as ultracentrífugas, a Aeronáutica cuidaria de buscar o enriquecimento por laser e ao Exército caberia cuidar do aproveitamento do plutônio. Por uma série de circunstâncias, os esforços do Exército conduziram a nada. A FAB, segundo informações reservadas à época, conseguiu fazer o enriquecimento em laboratório. A Marinha obteve êxito, conseguindo enriquecer primeiro a 3% e depois a 5% − suficiente para fazer funcionar uma usina átomo-elétrica capaz de abastecer uma cidade de médio porte. Apesar de os trabalhos da Marinha sofrerem constantes cortes de verba − o que impediu se desenvolvesse o projeto do submarino atômico, agora entregue à França − foi possível trabalhar no aperfeiçoamento das ultracentrífugas. Esses progressos não foram comunicados à AIEA. É por isso que os Estados Unidos insistirão em que o Brasil assine protocolo adicional ao TNP, permitindo que as inspeções da Agência se façam a qualquer momento nos locais que ela considerar indispensáveis − para atestar que o Brasil não pretende acumular urânio para fazer a bomba. Os Governos brasileiros, reconheça-se, negam-se a tanto.

 

     A crise com a Argentina foi a mais séria que o Governo Geisel teve que enfrentar. Alegando que a cota da barragem de Itaipu prejudicaria economicamente a usina de Corpus, que a Argentina pretendia construir, Buenos Aires fez de tudo para, um, diminuir a altura da barragem e, dois, ter o direito, como país a jusante, de inspecionar todas as obras a montante − o que permitiria opinar sobre o complexo hidrelétrico Tietê-Paraná. A disputa diplomática foi longa e árdua, o Brasil conseguindo, finalmente, construir Itaipu de acordo com o projeto inicial. O problema, entretanto, só foi de fato resolvido no Governo Figueiredo.

 

     Se o Governo Médici, por diversas razões, alcançou a popularidade que apontamos no artigo anterior, no período Geisel podemos dizer que o processo iniciado em 1964 − seria mais correto dizer em 1968, com a edição do Ato Institucional nº 5 − começa a marcha no sentido de seu nadir. O Governo Geisel já não tem a simpatia popular, apesar dos esforços do General Golbery do Couto e Silva (Chefe da Casa Civil) buscando convencer que o processo político brasileiro deveria ser compreendido como os movimentos do coração − diástole e sístole − e, por volta de 1978, já era possível observar a oposição de diferentes setores da sociedade. A Imprensa, ainda sob censura, passara a dedicar-se, por alguns de seus veículos, a apontar os erros na condução da política econômica, insistindo na tecla de que as empresas estatais eram em grande parte as responsáveis pelos problemas orçamentários e do balanço de pagamentos, além de apontar, ora aqui, ora acolá, violações dos direitos humanos pelos quais responsabilizava, com razão, a Polícia Civil. Na maioria das Universidades, o clima era de oposição, ainda que não ostensiva.

 

     É nesse período que se registra (1975) a primeira invasão de terras pelo autodenominado MST e que as oposições sindicais, no ABC, iniciam os movimentos que culminarão com as greves promovidas pelo Sindicato dos Metalúrgicos liderado por Luís Inácio da Silva, o Lula. Será, no entanto, no setor empresarial que a tão propalada (a nosso ver nem sempre realizada) aliança entre o empresariado e o Governo se rompe, em julho de 1978, com manifesto assinado por grande figuras do empresariado nacional.

 

     A ruptura dá-se em decorrência do malogro do II Plano Nacional de Desenvolvimento, que não fora capaz de realizar os objetivos propostos apesar de muitas indústrias haverem apostado nele para seu crescimento. A indústria de base foi a mais atingida e será sua associação − Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Indústria de Base, ABDIB − que criticará o Governo por não cumprir o que julgava acordado: as empresas estatais comprarão das indústrias nacionais, evitando importação de máquinas e equipamentos, desde que houvesse similar nacional. Será um decreto-lei, permitindo à Petrobrás fazer suas compras no exterior, o que desencadeará o processo que culmina com o Manifesto dos Oito que, além de reclamar maior participação na elaboração da política industrial do Governo, adentra pela questão política. Esse Manifesto insiste na tese de que o desenvolvimento industrial repousa na indústria de base. No processo, a empresa nacional deverá ser favorecida e deverá haver uma política correta de gastos do Governo e das empresas estatais. Por outro lado, a manutenção de “níveis adequados de demanda, requer um programa de compras a longo prazo por parte do governo e das empresas estatais” . Os signatários vão mais longe: “A efetivação de uma política industrial, nos moldes que estamos preconizando, supõe uma participação ativa do empresariado em sua elaboração. Os órgãos encarregados de sua formulação deverão abrigar representações dos industriais, que poderão assim emprestar sua experiência e conhecimento no desenho das grandes linhas daquela política, ainda que não interferindo nas decisões administrativas”.

 

     No final, adentram pela situação política: “Acreditamos que o desenvolvimento econômico e social, tal como o concebemos, somente será possível dentro de um marco político que permita uma ampla participação de todos. E só há um regime capaz de promover a plena participação de interesses e opiniões dotados ao mesmo tempo de flexibilidade suficiente para absorver tensões sem transformá-las num indesejável conflito de classes: o regime democrático. Mais que isso, estamos convencidos de que o sistema de livre iniciativa no Brasil e a economia de mercado são viáveis e podem ser duradouros, se formos capazes de construir instituições que protejam os direitos dos cidadãos e garantam a liberdade. Mas defendemos a democracia, sobretudo, por ser um sistema superior de vida, o mais apropriado para o desenvolvimento das potencialidades humanas. E é dentro desse espírito, com o desejo de contribuir, que submetemos nossas idéias ao debate do conjunto da sociedade brasileira e, em especial, de nossos colegas empresários e dos homens públicos”.

 

     Já em fins de 1975 circulavam fortes rumores de que se preparava um golpe contra Geisel. Revelaram-se mera manobra de desinformação destinada a desviar a atenção da morte do jornalista Wladimir Herzog.

 

     A morte de Herzog teve repercussão inesperada. A Imprensa escrita publicou não apenas a nota oficial, dando conta de que o jornalista se suicidara, mas também as repercussões de parte da opinião pública. Centenas de pessoas assistiram à cerimônia ecumênica celebrada na Catedral da Sé, com a presença do rabino Henry Sobel, do pastor James Wright e do cardeal Paulo Evaristo Arns. O enterro foi acompanhado por dezenas de pessoas. Como que para desmentir a nota oficial, o corpo de Herzog foi sepultado no terreno destinado aos fiéis que haviam tido morte natural ou sido vítimas de violência, recusando-se o rabino a enterrá-lo na parte afastada do campo santo reservada aos suicidas. A repercussão da morte de Fiel Filho, atribuída à repressão, foi menor, embora diferentes entidades realizassem cerimônias em sua homenagem.

 

     Do ponto de vista militar, a morte de Fiel Filho seguindo-se à de Herzog, após terem sido eles detidos no DOI de São Paulo, teve conseqüências. E marcou, podemos dizer, um ponto de não retorno. Em Janeiro de 1976, três dias depois do falecimento de Fiel Filho, o General Ednardo D’Ávila Mello foi exonerado e substituído pelo General Dilermando Monteiro. A exoneração ficou evidente na forma pela qual se deu a substituição. A prática no Exército é que o Presidente da República nomeie o General X para o Comando de Y e nomeie para substituí-lo na função anterior o General Z. O decreto inverteu a ordem: o Presidente da República nomeou o General Dilermando Monteiro para o Comando do II Exército e transferiu o General Ednardo D’Ávila Mello. Um pequeno grupo de Oficiais ainda quis convencer o General Ednardo a resistir. Ele não o fez e passou normalmente o Comando. Fato que chamou a atenção de muitos foi que, dias depois da assunção do General Dilermando, membros da Comissão Central do PC do B foram mortos em uma refrega nas ruas da Lapa.

 

     A crise em São Paulo não abalou o Governo Geisel, embora o Presidente se tivesse desentendido com o Ministro do Exército, General Sílvio Frota, que não desejava a exoneração do Comandante do II Exército. O fato permitiu que se criasse um clima de restrições a Frota no Palácio do Planalto, que culminou com a demissão do Ministro no dia 12 de outubro de 1977. A versão corrente é de que o General Frota pretendia ser candidato à Presidência da República, contrariando os planos de Geisel. Segundo essa versão, na tarde do dia 12, Geisel chamou Frota a Palácio e comunicou-lhe que, por haver grande desentendimento entre eles, deveria Frota, se assim o desejasse, pedir exoneração. O Ministro após ter retrucado que Geisel deveria demiti-lo, teria retornado ao Ministério e convocado uma reunião do Alto Comando – que não pôde realizar-se porque Geisel também convocara os Generais para o Planalto.

 

     O que ocorreu foi relatado de diferentes maneiras. Em outra versão, no fim de Setembro, começo de Outubro, o General Fernando Bethlem, Comandante do III Exército, divulgou documento denunciando a infiltração comunista no Governo Geisel. Citava nomes − entre eles, o de Jarbas Passarinho. A crise que se abrira era grave, e a impressão geral era a de que Geisel, desafiado, demitiria o General Bethlem de seu Comando. Não o demitiu. Pelo que se soube depois, jovens Oficiais teriam tentado organizar resistência à sua demissão sem que Frota disso tivesse conhecimento. Por essa versão, de fato Frota convocou uma reunião do Alto Comando e ficou esperando a chegada dos Comandantes dos quatro Exércitos, Bethlem inclusive. Para sua surpresa, cada um dos Generais, ao chegar a Brasília, foi recebido no aeroporto por um emissário da Presidência que o levou diretamente a Palácio. As rádios já haviam divulgado a demissão do Ministro. No seu gabinete, Frota foi aconselhado com muito ardor a resistir à demissão, pois ela não fora publicada no Diário Oficial da União e ele, ainda, era o Ministro. Ele resistiu à pressão e a demissão se consumou. Os jovens Oficiais que se haviam mobilizado para defender Fernando Bethlem foram tomados de surpresa ao saber, pelo rádio, que o General – que denunciara a presença de comunistas no Governo Geisel – tinha sido nomeado Ministro do Exército.

 

     Geisel escolheu para ser seu sucessor o General João Batista de Oliveira Figueiredo, então Chefe do SNI.

 

– segue –

 

 

 

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